20 de outubro de 2012

Um tratado político com imagens giríssimas para compensar o excesso de letras


Parece que algumas das pessoas que por cá ainda se atrevem a tentar a difícil e perigosa actividade de utilizar a cabeça para pensar, começam a chegar à conclusão de que o sistema político saído do pós-25 de Abril e consolidado nos anos seguintes, atingiu idade suficiente para poder ser questionado de modo a que se perceba o que serve e deve continuar e o que não serve e deve ser alterado. Se quiserem, podem chamar a isso uma reforma do sistema político, por mim tanto faz. A objecção que coloco é que a maioria dessas pessoas, quando falam de reforma do sistema político, estão a referir-se a pormenores como o número de deputados e a possibilidade de candidatos independentes às câmaras municipais, por exemplo. E, uma reforma do sistema político que tenha interesse e possa servir para alguma coisa, está muito para lá do número de deputados e dos candidatos independentes. Reparem na genialidade ao contrário de António José Seguro, que na semana em que as pessoas percebem que o governo de coligação estava em risco de queda e que a assistência financeira a Portugal poderia ficar em causa gerando uma crise politica ainda maior, utilizou a sua redonda cabeça, cuja única utilidade perceptível é a de ser suporte para pendurar os óculos, e avançou com uma medida “importantíssima” como a redução do número de deputados. Tudo aquilo que as pessoas queriam ouvir naquela semana, não é?

Fazendo uso da minha solidariedade intelectual, deixo aqui uma primeira leitura para os interessados. No caso, um livro que nos mostra muitos dos problemas e dificuldades de um sistema político fundamentalmente assente em partidos, nas sociedades contemporâneas e que, de seguida, avança alguns dos caminhos a trilhar e soluções a testar. Digo isto porque Portugal é um dos países onde mais se evidencia esta situação de crise do sistema político-partidário, o que se manifesta na evidência que qualquer comum mortal consegue sintetizar na máxima: “os partidos são todos iguais”. Os partidos não são todos iguais mas quando as pessoas dão por si a desejar que esta coligação Passos-Portas condimentada com a presença de Gaspar, Relvas e Cristas, não caia porque, do outro lado, em fila de espera, está António José Seguro e a sua inflamada importância, só pode dar mesmo para as pessoas apregoarem que “eles são todos iguais”, fazendo uso da cartilha taxista-salazarista. O livro é este.



Não sendo meu objectivo avançar com soluções (que nem sei se tenho), pois é para isso que devem ocupar o vosso tempo a ler e a investigar sobre as coisas, não vou ao Aki comprar parafusos e cola de contacto sem antes partilhar convosco uma das questões que por esse mundo fora, onde há pessoas que pensam nas coisas e se estuda ciência politica a sério, o tema é tratado. Tema que em poucas palavras poderíamos definir como o da banalização do estatuto das classes políticas.



Passando a explicar. Muita gente puxa logo do revólver antes de perceber de que é que se está a falar quando se está a falar de elites. Torcem o nariz porque ainda têm a cabeça encharcada pela propaganda marxista, e não só, que desde sempre atribuiu ao conceito de elite uma conotação negativa, associando-o a aristocracias balofas, sistemas de castas e oligarquias do género. Mas o conceito de elite não é isso. Ou melhor, pode ser muito mais do que isso. Que diria o mais militante dos anti-elitistas se o Paulo Bento, na próxima convocatória, convocasse o Medina Carreira para guarda-redes? Diriam que o gajo estava doido e diriam bem. Mesmo que o Medina Carreira dissesse que se ia esforçar porque toda a sua vida tinha feito isso, estudando e tentando conhecer, como faz sempre. Isso não bastaria para que o episódio não deixasse de se tornar uma anedota. Pois bem. Mas quando Assunção Cristas foi empossada Ministra da Agricultura e de mais umas coisas e afirmou em entrevista que não entendia nada de agricultura mas que ia estudar e dedicar-se aos dossiers, “graças a Deus”, poucos acharam essa nomeação uma patetice digna de riso e/ou indignação. Como é que é? Vais para ministra da agricultura e dizes que agora é que vais estudar os assuntos? Então o ministério da agricultura é um centro de estágios? Assunção Cristas, como ministra da agricultura, é a mesma coisa que o Medina Carreira na baliza da selecção.





O que acontece é que para se ser piloto de aviões, futebolista profissional, operador de call-center para resolução de problemas de acesso à internet, ainda é preciso ter conhecimentos e fazer prova disso com vista à função que se vai desempenhar, ou seja, é necessário fazer parte da elite dos que são capazes para essa tarefa. Para se ser ministro, por exemplo, nada disso é preciso, saltando os ministros de ministério em ministério como se percebessem dos assuntos todos (o que mostra que não percebem de nenhum). A isto podemos chamar de banalização: o alinhamento não é feito pela excelência, como numa elite, mas pela incapacidade e indiferença pela função. Como na escolha de um governo que por cá existiu em que a distribuição foi feita por quotas, permitindo que a Dona Teresa Caeiro saísse de casa a pensar que ia tomar posse na Secretaria de Estado da Cultura e acabasse a tomar posse, umas horas mais tarde, no Ministério da Defesa. Uma perguntinha: se toda a gente está de acordo que para se jogar na selecção só uma elite – sim, uma elite – de indivíduos é que é elegível, porque é que essas mesmas pessoas se empertigam todas quando alguém afirma que para governar um país só uma elite deveria poder ser capaz? Um dos problemas do actual sistema politico é a banalização das elites, como poderão ficar a saber se lerem este livrinho que contém análises de caso suficientes, muito bem detalhadas sobre como a tal democracia nem sempre é tão “democrática” quanto se pensa.




A selecção é uma elite: nem todos lá podem jogar e ninguém se lembra de dizer que isso é antidemocrático. As competências e capacidades podem ser intelectuais, de trabalho ou físicas. Só gajas boas e altas podem ser modelos e ainda bem que é assim: são uma elite. Que me ingressa que seja burras: sabem despir-se e caminhar porque é isso que lhes exigem. Para cada actividade há um conjunto de competências e capacidades que levam a pessoa a destacar-se. Para se ser escritor é preciso ser capaz de escrever, para se ser músico é preciso ser-se capaz de tocar, para se ser bailarino é preciso saber-se dançar. Nem toda a gente pode ser primeiro ministro como nem toda a gente pode ser modelo. Mas o que acontece é que hoje quase qualquer um pode ser ministro, sem o mínimo de competências exigíveis para se exercer o cargo. E aí estão os Passos e os Relvas. Tipos que numa sociedade verdadeiramente democrática nunca fariam parte da elite de potenciais ministros, fosse do que fosse. Pois então se há elites para a bola e para a música, porque é que não há, por exemplo, para cargos políticos, cargos de nomeação do estado e cargos em empresas dependentes do estado? Vêm outra vez com a ladainha da democracia, porque não percebem que a ladainha da igualdade de oportunidades tem consequências antidemocráticas, como vermos Miguel Relvas ministro, seja do que for. Ou vermos o Fernando Seara, candidato a todas as merdas onde dá para se ser candidato porque aquilo de que ele mais gosta na vida é ser candidato, uma vez que isso dá para aparecer na televisão mais uns minutos.

Desenganem-se se pensam que isto é só em Portugal. Um argumento tão forte para a prova da existência de Deus, como o argumento ontológico de Sto. Anselmo, é o facto de a Alemanha do Hegel e da Mercedes também ter dado ao mundo os Modern Talking e a Ângela Merkel.




E em França as coisas não correm pelo melhor. O case-study Nicolas Sarkozy, um gajo que aparecia sempre com aquele ar “ça va, desta já me safei, ufff...” e dava a impressão de que só tinha sabido 5 minutos antes de que se tratava a reunião ou a conferência a que chegava montado nos seus sapatos à Prince, com 5 centímetros de salto. Como já tive oportunidade de esclarecer noutros fóruns, a republique teria ganho muito se alguém tivesse pegado na viola da mulher do Nicolas e a tivesse partido nas trombas do próprio Nicolas: o gajo ficava quieto e a esposa não cantaria durante uns tempos, factos indiscutivelmente proveitosos para o bem da humanidade.




Este anti-elitismo militante que se traduziu no virtual acesso de todos a todo o lado, é péssimo, se querem assim uma espécie de conclusão simples e directa. Mal se diga que uma pessoa sem currículo, competências e conhecimentos, moradora em Massamá ou no rio que a parta, não deveria poder governar um país, vêm logo com a conversa bacoca do elitismo. Pois então fiquem lá com a vossa democracia do "todos capazes de tudo". Ainda há muita treta para o Seara se candidatar e muita pasta para o Relvas tutelar. E não vou ser eu o reaça que lhes vai machucar a vaidade. Divirtam-se que eu tenho que ir ao Aki antes que se faça tarde.

4 comentários:

  1. Este conceito de elites, interessa-me. Os livros sobre sociologia política, é que já são um pouco demais para mim.


    Continua, muito gosto em lêr-te!

    (ah! e as músicas -revisitar os echo é sempre bom- e aqueles beach house do outro dia, foi do melhor que ouvi recentemente)

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  2. hahahah o tempo que levei para perceber "Mercedes"- O tempo, sempre o tempo.

    Há muito tempo um alemão disse-me que a diferença entre Portugal e uma Alemanha era que por lá quem gere o País e a sociedade é a elite e que por cá quem sempre nos gere é a mediocirdade, foi como uma revelação.

    Sim, concordo com o post há que perder qualquer tipo de complexos e um dia quando o povo for mais instruído lá chegaremos e a selecção se fará...

    as imagens não são giríssimas mas servem :)

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