14 de novembro de 2012

Há pessoas que confundem a biblioteca de Alexandria com a biblioteca da Alexandrina



Pior do que aqueles que confundem as coisas porque não são capazes de as entender, são os que as confundem de propósito para daí tirarem dividendos. Baralhar e voltar a dar, ou dividir para reinar, ou tudo ao molho e fé em Deus, ou ainda, e para terminar esta intro, çafoda queu quero é questa merda vá toda pó caralho.

O tema deste meu ensaio, para lá de mais uma vez mostrar a quem por aqui passa a minha disponibilidade para ocupar o meu tempo com assuntos de índole cultural, é elevar a um patamar de intemporalidade o conceito de confusão e desenvolvê-lo enquanto categoria filosófica, a mais substancial categoria filosófica do nosso tempo, um tempo incerto e nebuloso, como já terão constatado todos aqueles que olham para as montras das livrarias. Esta minha contribuição dá um passo em frente e avança com o tema a partir dos prolegómenos publicados pelo alf, num post que em boa hora intitulou de barafunda. Prova provada e certificada de que ambos temos a percepção daquilo que interessa realmente e somos suficientemente bondosos para partilhar com todos aqueles que seguem os nossos sermões, alguma da sapiência que possuímos e de que a humanidade tanto precisa.

Sendo eu uma pessoa extremamente sincera, não posso prosseguir o meu ensaio sem assumir desde logo, perante todos vós, meus estimados leitores, que também faço as minhas confusões. Este acto credibiliza-me e não tenho problema nenhum em revelá-lo. Assumo sem problemas: confundo os The Walkmen com os The National, mas calma, isso não me importa nada porque se trata de duas bandas igualmente aborrecidas e merdosas. Também confundo Sónias com Sandras e isso também não me preocupa porque conheço poucas e não há probabilidade de essa confusão vir a dar algum mal-entendido, daqueles em que a minha vida não literária tem sido pródiga.

Alerta-me o alf para uma questão deveras pertinente sobre os títulos de alguns dos livros que saltitam como cavalinhos de um carrossel, nesta feira que é o mundo literário português (metáfora fraquinha, eu sei, mas é para vocês também perceberem as minhas fragilidades, para que me vejam como um dos vossos e não apenas como um gajo que leva uma vida de sonho que é jogar golfe, ler livros e orientar umas gajas). Pois respondo ao alf que mais facilmente compraria um livro chamado Para o Caralho e Não Para a Cona da Tua Mãe do que um que se chame Para Cima e Não Para Norte. Duvidam? Comprei o Discurso Sobre o Filho da Puta do Alberto Pimenta por causa do título, quando ainda nem fazia a mínima ideia de quem era o Alberto Pimenta. E quanto ao No Meu Peito não Cabem Pássaros, já estou a pensar chamar no Meu Meu Bolso Não Cabe o iPhone 5 a um dos contos que ando a escrever: a história de um gajo que fode um iPhone 5, apenas com uma semana, atirando-o para a linha na estação de Caxias, quando recebe um SMS da namorada que está a fazer um MBA em Londres, dizendo: “Olha, quando chegar a Lisboa temos que falar.” Dirão vocês, foda-se este Paddock lembra-se de cada merda, deve ir longe com estas estórias, deve, deve. Esclareço-vos que isto não é fruto da imaginação; passou-se algo parecido comigo, e só não mandei um iPhone para o caralho pela simples razão que ainda não havia iPhones e também porque tive a lucidez de não lixar o Nokia que tinha na altura.

Mas voltemos ao conceito de confusão, prestando atenção ao exemplo de duas pessoas a todos os títulos inolvidáveis, Jorge Jesus e Cavaco Silva, que eu tomo a liberdade de associar no mesmo ensaio por entender que ambos partilham o mesmo problema: são não euclidianos num mundo em que toda a gente se rege pela geometria euclidiana. Mais ou menos o mesmo que seria conduzir pela direita em Inglaterra. E é isso que faz deles pessoas incompreendidas quando exprimem o seu saber em conferências de imprensa ou em posts do Facebook. Vejam bem, Jorge Jesus, um não euclidiano originário da Amadora, com vasta experiência nos postulados da geometria não euclidiana, como despachar o Ronaldinho Gaúcho por achar que aquilo era “fintinha a mais”. Esse mesmo Jorge Jesus propôs um dia a dois centrais e a um trinco que “os três fizessem um quadrado”. Bem sei que um dos centrais era o Luisão, outro não euclidiano que, precisamente por isso, conseguiu atirar um árbitro ao chão “sem lhe tocar”, mas mesmo assim um quadrado com três não parece fácil. Estas coisas, até para mim que tento pensar sobre o que o Vítor Gaspar diz, são muito complicadas. E dizer que a bandeira estava ao contrário implica saber de que lado fica o verde. Acham que quem não sabe quantos cantos têm os Lusíadas sabe de que lado fica o verde da bandeira portuguesa? E se perguntarem ao Jorge Jesus quanto cantos têm os Lusíadas a resposta dele será: “é 4 mas ê sou capaz de fazer um quadrado só com três jeeeegadores”.

Ou seja, isto é tudo muito confuso. No fundo, o que importa é que sejamos capazes de nos concentrarmos no essencial, mesmo não fazendo a mínima ideia de que é no essencial que radica a possibilidade do acessório, o quer que isso queira dizer (os ensaios filosóficos devem terminar de forma enigmática para serem considerados bons). Neste admirável mundo literário, frequentado por todo o tipo de escritores, incluindo escritores portugueses que estão dispostos a ir ao Brasil fazer leituras públicas em festivais literários, o livro é sempre cultura e se há coisa que fica mal nas pessoas de bem é desprezar a cultura. Viva a cultura, viva!

31 comentários:

  1. a filosofia da confusão é o confusionismo eh eh

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  2. Vá lá :) Fico grata por não teres incluído as silvias no rol das confusões entre sónias e sandras heheheh.

    Ainda ontem li numa entrevista com o Quintanilha e o seu parceiro algo que achei brilhante :)
    "cada um tem o Proust que merece" depois do "Proustaniza-te" de o mais peor foi do melhor que tenho lido :)))

    Será graças a um amigo meu que percebe de o essencial sem pré-tensões e que me avisa quando vale a pena ir até à Cornucópia (não confundir com as de doces de ovos que se compra em alcobaça) sim será ele que vai emprestar-me o tal Ruben A. :)))


    obrigada pela generosidade de partilhar com uma silvia de o seu saber :)))

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    1. Partilho o meu saber com todas as pessoas interessadas; não sou egoísta.

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    2. Não ser egoísta já é louvável :)

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  3. a silvia é caixa no pingo doce? (smile)

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    1. Não faço ideia; apesar de a minha espcialidade ser mais deixar listas de compras às empregadas,frequento o comércio local em situações de extrema necessidade.

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  4. AM,

    Antes caixa no pingo doce que no lidl :)))
    hehehheh
    Também leu a entrevista do Quintanilha ...:)))

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    1. Acho esse Quintanilha um bocado chato. Suficientemente chato para não me interessar pelas entrevistas que ele dá.

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  5. não seja caixa snob :)))
    o quint-anilha (e o parceiro) não sei quem são :)
    a minha curiosidade vai toda para a biblioteca da alexandrina :)))

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    1. Na biblioteca da Alexandrina constam as obras completas do José Rodrigues dos Santos, entre outras preciosidades literárias. Enfim, uma biblioteca de fazer inveja ao alf.

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  6. heheheh
    foi a proposito de supermercados tipo pingo doce que surgiu a tal :"cada um tem o proust que merece" :))))






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    1. No meu caso, só estou a ver uma maneira de ter o meu Proust: arranjar um gato e dar-lhe esse nome.

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    2. heheheh
      Não precisa de um gato :)
      Este blog diz o suficiente sobre o tipo de Proust que há em si:)))

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  7. desculpe :)
    esqueci-me que não deve ter percebido a graça :)
    pois sei que ainda não o leu :)))

    O Quintanilha é alguém que nunca achei muito simpático até ontem ter lido a tal entrevista :)



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    1. As minhas desculpas: empregadas de hipermercados não é bem a minha área. Eu é mais empregadas da Zara e da Massimo Dutti.

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    2. Cada um no seu ramo :)

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  8. também gosto, como sabe, de ler entrevistas :)
    http://www.guardian.co.uk/music/2012/nov/11/brian-eno-ha-joon-chang?INTCMP=SRCH
    cada um tem (ou não tem) o eno que merece...
    (e o livro também deve ser bom) :)

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    1. AM,
      Muito obrigada :)
      excelente

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    2. Obrigado pela referência: notável diálogo entre duas pessoas inteligentes.

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  9. Bom ensaio na linha ZMB. Selo EQPEC (Ensaio Produzido por Entidade Certificada).

    Confusões???...quem as não faz!!!
    Ultimamente confundo muito a puta da política com a política da puta. Já não sei se é por ter lido muito, se por ter lido pouco, se por ter ido pra cima em vez de procurar o norte com derrotas (termo náutico) correctivas!!!

    A cena dos títulos dos novíssimos escritores tem explicação, e científica, obedece precisamente à lei da compensação. Se nada há de interessante no livro… dá-se-lhe um título daqueles que enfim, não são sim nem não antes pelo contrário. O valor da obra está no título caralho!!!... nem percebo como tu e o alf ainda não chegaram lá… lêem de mais é o que é!!!
    O novíssimo escritor, e não tão novíssimos assim, não escreve, compõe títulos. Esta treta do marketing é bizantina… e tu devias saber isso!!!

    Já o jesus, jorge de nome, e o cavaco, que também é silva e ainda arranjou maneira de ser aníbal numa discreta e sofisticada sugestão de coragem bélica e inteligência estratégica, tenho pra mim que são euclidianos, mas desenrascados, gajos espertos, empreendedores na novíssima terminologia.
    Martelam a geometria euclidiana acrescentando-lhe o velho postulado: em política e futebol, o que parece é.
    No caso do Jesus e do quadrado da tripeça, a coisa é clara. Três pontos definem um plano, já quatro definem dois e em terreno acidentado a coisa abana. Como em futebol, e de acordo com o postulado anterior, o que parece é, ele chamou-lhe quadrado pra confundir o adversário mas na realidade eram três sólidos pontos que, qual tripeça, independentemente das condições do terreno pode partir… mas não abana!!!
    O senhor Aníbal partilha, com discreta militância, o mesmo postulado… parece incompreendido, logo é incompreendido!!!... tudo o que o futuro nos reservar ele já previu, só que não compreendemos!!!

    E m casos mais complicados, como saberem de que lado é o verde da bandeira e coisas igualmente exigentes, usam a técnica dos daltónicos, se os castelinhos estiverem de pernas pró ar… está mal!!!

    Podes crer, os recursos destas personalidades são limitados… mas eficazes!!!

    Isto aí pra cima deve estar muito confuso, de modos que também vou terminar de forma enigmática.
    No fundo o que importa, é arrancar o acessório e regar o essencial para termos sol na eira e chuva no nabal… e viva o culturismo, a rega por aspersão e a coisa alexandrina… viva viva!!!

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    1. Caramba, és rápido. Um dia destes ainda examinas os meus ensaios antes de eu os escrever.

      Quando é que crias um blog?

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  10. Eu também já comprei livros pelo título, mas não recomendo (o crime do padre amaro foi o primeiro que "cravei" ao meu pai)
    Ainda não li a entrevista do Quintanilha, mas vou procurar que costumo gostar muito (o seu companheiro, é um dos meus escritores favoritos)

    - Encontramo-nos nos Black Keys?

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    1. alba,

      Do crime do padre levarei comigo até à eternidade a imagem da cama que rangia :)))

      nunca li nada do richard não sei das quantas mas um dia quem sabe vou ler:)fiquei com uma ideia completamente diferente daquela que tinha dos dois :)

      bjs





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    2. silvia,
      o crime do padre foi do melhor que podia acontecer a uma miuda de 16 anos :)

      nunca leste o "O último cabalista de Lisboa"? é um dos meus livros favoritos. Só não o empresto, porque apesar de já ter tido 3 exemplares, distribuo-os sempre (ou alguém por mim).Essa saga é toda gira, mas dos últimos livros, não tenho gostado tanto.

      bjs

      ps:também para o capitão, por nos proporcionar este espaço de convivio ;)

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    3. Estejam à vontade... já não tenho é água tónica, mas podemos continuar com o gin enquanto houver gelo e limão.

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    4. agradeço, mas gin não posso, que tenho más (mesmo que poucas)memórias de 2 festas, em que faltou a água tónica.

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    5. Nunca li nada desse Zimler. E gostei muito do Crime do Padre Amaro, já o li há muito tempo e nunca mais lhe peguei.

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  11. Infelizmente não: a vida de um filósofo cosmopolita como eu é feita de múltiplos compromissos inadiáveis.

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